A TV CULTURA VOLTA AO PLURALISMO E RENOVA ESPERANÇAS NO JORNALISMO PÚBLICO​
  • há 6 anos
O reintrodução de um mínimo de pluralidade no jornalismo da TV Cultura, outrora a mais poderosa e relevante emissora pública do país, é a notícia alvissareira do momento, no sombrio mundo da mídia brasileira.

O movimento começou há um mês, com a condução de Ricardo Lessa à apresentação do programa Roda-Viva, e a efetivação de um veterano da casa, o editor Ricardo Taira, na direção de jornalismo.

O “Jornal da Cultura” já vinha tentando manter algum equilíbrio de opiniões, no formato de noticiarismo comentado que adotou há vários anos.

Foi o formato possível para se manter no ar, na absoluta penúria financeira em que vive, e na incapacidade de concorrer na cobertura extensiva dos fatos, com gigantes como a Globo, Bandeirantes ou Record.

Mas o equilíbrio entre opiniões contrastantes sempre foi precário ali.

Enquanto os comentaristas conservadores operavam normalmente no registro da eloquência, do destempero e até do desatino, seus oponentes progressistas reagiam com uma constante timidez, prudência e mesmo ambiguidade.

Agora, em contraste, já aparece na bancada do “Jornal da Cultura” até um polemista incendiário como o sociólogo Jessé Souza, para dizer com todas as letras que a Operação Lava-Jato é “o maior engodo da história do Brasil”, porque pratica uma justiça seletiva, desinteressada em delações sobre crimes do mercado financeiro e da própria mídia.

Mas é o carro-chefe da programação jornalística da Cultura, o seu programa de maior prestígio em passado não tão remoto, que sofre a mudança mais nítida.

O Roda-Viva não é mais o clube da imprensa golpista em que foi transformado, exclusivo de jornalistas da grande mídia corporativa.

Agora têm acesso à sua bancada os blogueiros de esquerda e convidados de áreas diversas, universidade à frente, numa saudabilíssima oxigenação de pontos de vista.

Ao centro da roda, não são mais convidadas apenas as personalidades da direita, para um ritual de congraçamento com os seus entrevistado​re​s, ou os desavisados da esquerda, que se dispunham a experimentar o pau-de-arara verbal reservado exclusivamente para eles.

Agora se alternam ali os campos reais da política brasileira e um Guilherme Boulos já pode ser convidado, a despeito do reacionarismo reinante considerá-lo um perigoso subversivo, líder de uma agressiva milícia popular.

Especula-se se esta mudança de rota na TV Cultura, determinada pelo Conselho Curador da emissora, teria partido do governo de São Paulo, fonte de todo o poder e verbas da emissora.

Especula-se, mais ainda, se ela será mantida no atual governo-tampão do PSB, cuja ala paulista só difere do PSDB pela falta de um D em sua sigla.

Nada garante nada nesses tempos sombrios de pós-democracia, de legalidade seletiva e guerra suja na política.

Mas, se o país quiser retornar à convivência democrática normal, civilizada, é indispensável que ao menos a sua mídia pública persiga intransigentemente a isenção e a pluralidade - o que já não existe mais na mídia corporativa, e nunca houve na militante.

O que é público é de todos, até porque é pago por todos. Nenhum campo pode ser banido da tela pública.

Que esta alvissareira “primavera" da TV Cultura replante e faça florescer o jornalismo em toda a mídia pública, sob controle de quem ela estiver.
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